terça-feira, 17 de janeiro de 2012

O que eu sei do doutor Maia - Por Edir Gaya

Recebi o escrito abaixo, por mail, do amigo dileto e jornalista Edir Gaya, que milita na imprensa paraense. Sobre o querido Castagna Maia:

Crítico na reflexão, generoso na ação, o Dr. Maia sintetizava como poucos o pessimismo da inteligência e o otimismo da vontade. Lembro-me de quando enfrentávamos, no Sindicato dos Bancários, uma dessas epidemias de assaltos a banco que costumam nos assolar durante os governos tucanos, em 2002 ou em 2003; já utilizáramos todos os recursos possíveis de denúncia e precisávamos de um fato político, na esfera da Justiça do Trabalho, que atraísse a atenção da sociedade para o drama enfrentado pela categoria, sobretudo no interior, junto com as populações de cidades sujeitas à violência de assaltos organizados por quadrilhas bem armadas, cuja ação se baseia no terror do sequestro e das execuções sumárias.

 Foi o Dr. Maia que nos trouxe, dos petroleiros e dos químicos, o socorro pela via jurídica, arguindo a tese do “direito de recusa”, segundo a qual o trabalhador tem direito a se recusar a trabalhar em locais onde, comprovadamente, há riscos para a sua integridade física. Entramos com a ação na Justiça do Trabalho e no processo de negociação reforçou-se o papel da Comissão Estadual de Segurança Bancária, que no decorrer daqueles anos teve um papel fundamental para fazer recuar a violência dos assaltos a banco no interior - que agora infelizmente voltam a recrudescer.

 Eu o conheci no processo de discussão da Caixa de Previdência e Assistência do Banco da Amazônia, a Capaf, e do relatório Bouz-Allen, através do qual o tucanato pretendia incluir os bancos públicos no leilão da privataria, cuja crônica o jornalista Amaury Ribeiro agora nos traz à tona. O Dr. Maia dominava, sob a perspectiva dos trabalhadores, uma questão fundamental para um País que envelhece a passos largos: a Previdência Social. Dedicava sua inteligência e argúcia à tarefa de desviar armadilhas, denunciar sacanagens e apontar rumos para que pudéssemos assegurar nossos direitos.

 Para além desse compromisso, era uma pessoa afável, da música, das boutades, da poesia, da leitura atenta e da ação fundamentada. Era gaúcho, o Dr. Maia, mas nunca tuteamos, apesar de que ele insistisse que eu não precisava chamá-lo “doutor”. Expliquei-lhe que eu não chamava “doutor” a qualquer um. Rimos e selamos nossa amizade em Brasília, onde por mais de um mês, por recomendação de Vera Paoloni, trabalhei com ele, na campanha política para o CREA, do engenheiro e físico José Walter Bautista Vidal, o Pai do Pró-Álcool, uma das figuras públicas mais fascinantes que eu já tive a oportunidade de conhecer. Lembro-me que o Dr. Maia foi me apanhar no aeroporto em um Mercedes, daqueles dos filmes de James Bond da década de 70, bege, bem segunda-mão – um fetiche - como o fusca da época de estudante que ele mantinha em casa – além de um piano de cauda deixado pela senhoria, maravilhoso.

Me fez ter uma perspectiva diferente de Getúlio Vargas e do nacionalismo no País. Considerava um equívoco da esquerda, sobretudo do PT, se divorciar da linha histórica aberta pelo trabalhismo, compartilhava a sua admiração por Brizola e Darcy Ribeiro, mas nada em tom maçante ou professoral; com ele a conversa fluía sempre natural, ilustrada por fatos interessantes, acontecimentos relevantes, revelações e vislumbres de quem de fato tem um prazer de gourmet pelo conhecimento e o serve com a mesma generosidade com que o produz.

Seu blog é referência a quem busca análises fundamentadas em fatos, ação e reflexão. É um chamamento radical e profundo à realidade presente, para que se possa transformá-la no futuro.

No ano passado, nos encontramos em Belém, na AEBA. Em 15 minutos de conversa, ele me descortinou as oportunidades oferecidas ao jornalismo a partir da web; tinha planos na área, escrevia como poucos, um estilo vigoroso, como ele próprio, e que você não consegue interromper a leitura, mesmo que o tema seja árido.

Não fazia o estereótipo de um homem diagnosticado com câncer. Não seria nunca um estereótipo de nada. Fosse médico, seria o Dr. Rieux, de A Peste, para quem a principal tarefa é aliviar o sofrimento do outro. Era advogado, o Dr. Maia, e infelizmente não há romances sobre advogados como ele.

2 comentários:

hupomnemata disse...

Olá Verinha,
Ótimo esse texto do Gaya. Concordo plenamente. Eu também aprendi muito com o Maia. Seus blog é antológico e todos perdemos muito com sua ida.
Abraço.

Unknown disse...

Valeu Edir Gaya

Grande abraço

 
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